quinta-feira, 11 de abril de 2013

Se ao menos eu tivesse um cérebro...

Um dos livros que li durante minha graduação se chama "Comportamento Humano Complexo". Desde aquela época acho engraçado este título: existem comportamentos humanos simples? Nos últimos capítulos, os autores tratam do mais complexo dentre toda a complexidade: o comportamento verbal.

(pausa para simplificações grosseiras da Análise do Comportamento, desculpa profª Vânia, desculpa Skinner)

Comportamento não-verbal é aquele que tem consequências diretas.

A- tenho sede
B- pego um copo de água
C- bebo água

Típica análise A-B-C, Antecedente, Behavior, Consequência.

Comportamento verbal é aquele que tem consequências mediadas por outro sujeito.

A¹- tenho sede
A²- tem outro sujeito perto
B-  digo: "sujeito, traga-me um copo de água, por favor"
C¹- o sujeito pega um copo de água e traz para mim
C²- bebo água

Este episódio verbal básico é só o início, eu poderia descrever uma longa cadeia de comportamentos, incluindo eu dizer "obrigado" para o outro sujeito e o meu agradecimento se torna Consequência para os Behaviors dele, que por sua vez sorri, o que se torna Consequência para meu "obrigado" etc. etc. etc.

(fim da pausa para simplificações grosseiras da Análise do Comportamento e início das conclusões grosseiras acerca disso tudo)

A partir disso, percebam o quanto o comportamento verbal nos prepara para o mundo. Não precisamos manipular nosso ambiente de forma imediata, podemos manipular o outro para que ele manipule nosso ambiente. O ambiente humano é, portanto, uma rede de manipulações de comportamento.

Ao mesmo tempo que o comportamento verbal nos prepara para o mundo, também nos impede de sermos tão suscetíveis à manipulação: uma vez que eu "falo para mim mesmo" como funcionam as coisas com o sujeito X ou Y, esta "fala interna" (conhecida popularmente como "pensamento", "consciência" e sinônimos) nos prepara para rompermos o ciclo de manipulação. Em condições ideais, eu posso parar de mediar as consequências para o outro: "ah, levante-se e pegue você mesmo sua água!"

Ao processo de observar correlações e criar "falas internas" sobre elas chamamos "raciocínio", que é a base das diferenças entre nós e todas as outras espécies animais. Viver sem este processo é o primeiro passo para nos mantermos manipuláveis. Animais não criam falas internas, não raciocinam, não são capazes de saber de antemão como se comportar com os outros sujeitos. E mais importante: não são capazes de compartilhar com os outros os seus aprendizados, senão na forma da interação. Nós sempre podemos escrever ou falar os nossos pensamentos e, com isso, alertar aos outros; em parte, é assim que nós aprendemos que devemos olhar para os dois lados da rua para que não morramos atropelados, a lavarmos as mãos para evitar contaminações, a trabalhar a vida toda para podermos usufruir de uma velhice confortável décadas depois...

Pensar liberta o ser humano dos outros seres humanos. Simbolicamente, é como o desejo do Espantalho de O Mágico de Oz: ao pensar, ele é capaz de sair da estaca na qual estava amarrado. If I only had a brain...


Um comentário:

  1. nunca assisti o Mágico de Oz, mas já sei (pq a vida ensina, ah como essa maldita ensina) que pensar é necessário. é mais do que necessário, é vital.

    (porém tb aprendi que pensar enlouquece e aí eu fico nessa sinuca de bico apenas enlouquecendo e morrendo ao mesmo tempo enfim, cê me entendeu)

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